Este documentário retrata os comportamentos dos adolescentes que vão na sua viagem de finalistas, num ambiente equivalente ao dos nossos finalistas de 12º ano em Lloret del Mar. A diferença? O nível de irresponsabilidade, parece-me. Não sou, de todo, apologista deste tipo de viagens: hormonas, álcool, e o sangue na guelra próprio destas idades são o cocktail explosivo perfeito. Em todo o caso, entendo perfeitamente que se queira uma semana de loucura memorável - faz parte da idade, não o nego. O que não entendo é o nível de irresponsabilidade e de falta de respeito pelo próprio e pelo outro a que se chega, com consequências desastrosas.
Os próximos parágrafos que vão ler foram escritos mal acabei de ver o documentário - tudo fresco, portanto.
No centro de tudo: o sexo, a imagem social, a pressão de pares, a necessidade de ser validado.
EDIT: este post não é, de maneira nenhuma, uma defesa que não podemos fazer x ou y, ou de que não podemos ser/agir de forma mais sensual, ou que não podemos publicar uma foto mais sexy se assim o desejarmos. Eu também o faço quando quero, e isso faz parte da minha identidade. Apenas pretendo levantar uma reflexão sobre a valorização que damos a estas questões, e o impacto que a pressão social nos impõe na hora de nos definirmos como indivíduo. Seguindo:
A masculinidade que é imposta aos rapazes exige-lhes que sejam viris, que estejam com várias raparigas na mesma noite, e os reis da festa serão aqueles que conseguirem apanhar mais miúdas, estejam elas conscientes ou não - não é uma conclusão minha, são eles mesmos que o dizem. Há uma pressão doentia para que o sexo seja o foco central da sua vida, o que é admitido por eles mesmos: podiam não querer perder a virgindade mas fizeram-no porque estavam a ser gozados; podiam não querer ir sair mas foram porque se não o fizessem iam ser os "pussys"; podiam não querer fazer sexo mas a oportunidade surgiu e um homem a sério não pode dizer que não.
Com as raparigas, a realidade é a mesma. É mostrado um concurso de dança em biquini. Duas jovens em destaque inscrevem-se, pensando que se divertirão enquanto têm todos os olhos postos nelas - este lado humano de querer validação... - e, chegado o momento, divertem-se a dançar. Imediatamente após o fim da sua actuação de 10 segundos, o host do concurso sugere a uma que faça twerk de costas para o público. Ela hesita, e faz. À outra sugere que tire o soutien, começando toda a multidão a gritar. Ela não cedeu. A verdade é que ambas confessam depois que se sentiram humilhadas naqueles momentos: a primeira, por ter acedido sem pensar e se ter apercebido depois que naquele momento a sua sensualidade não era um poder seu, mas sim um instrumento para o público; a segunda, por se ter sentido pressionada e ter quase cedido a algo que ela tinha bem assente que nunca iria fazer. Ninguém é imune à pressão social - tod@s já fizemos coisas que não queríamos porque sentimos que "é o que toda a gente faz".
Como um dos comentadores no documentário refere, a imagem da sensualidade da mulher (ou do homem!) não é má, desde que rodeada de imagens de tudo o mais que se pode ser. O problema é o contexto, e também a ausência de outras aspirações e inspirações. Facilmente atribuímos o nosso valor única e exclusivamente à atracção que somos capazes de exercer sobre os outros e, quando esse desejo não é correspondido, revela-se altamente prejudicial à nossa auto-estima e ao nosso ego (sejamos mulheres ou homens). Não tenho absolutamente nada contra a liberdade sexual de cada um - o prazer é nosso, o corpo é nosso, a vida é nossa! - mas quando essa "liberdade" é na realidade uma sexualidade forçada pela pressão social e é a única ferramenta de valoração do próprio, então algo está muito errado.
Durante as filmagens houve um caso de uma violação em grupo, no meio da praia, durante o dia, com milhares de pessoas à volta (literalmente milhares). Ninguém fez nada. As raparigas em risco eram apalpadas, despidas, forçadas contra a sua vontade, como é mostrado em vários momentos, e ninguém faz nada. Gritam por ajuda. Nada. A visão deste tipo de comportamentos como sendo "o que toda a gente faz" tem aqui consequências assustadoras.
Isto reflecte o lado doentio da cultura sexual em que nos inserimos. A banalização do sexo e a sua utilização como arma publicitária, arma de arremesso, arma de persuasão, têm necessariamente consequências gravosas. Ainda há dias discutia isto: é verdade que qualquer pessoa que concorde em participar numa campanha publicitária sexual sabe o que está a fazer (tipo aquela da Surf que me dá a volta ao estômago de cada vez que a vejo). Mas a verdade é que este tipo de atitude banaliza o assédio. Banaliza o piropo indesejado. Banaliza a sensação de insegurança. Banaliza o apalpão e o abraço com extras dos desconhecidos no meio de uma discoteca. E, sem equilíbrio entre o cuidado para não fazer do sexo um tabu e o exagero de utilizar o sexo como centro de tudo, nunca teremos um ambiente seguro em que o respeito é o verdadeiro centro das relações.
Felizmente, parece-me que este tipo de comportamento não está tão enraizado nos adolescentes e jovens adultos portugueses, pelo menos na prática. No entanto, temo que o facto de ter crescido rodeando-me de quem queria, escolhendo as companhias a dedo, me tenha criado uma redoma que me afasta dessas realidades - a verdade é que, de cada vez que me deparo com este tipo de comportamentos, fico perplexa e sem reacção.
Fiquem à vontade para discordar, para deixar os vossos 2 cents, para dizerem o que quiserem. Just had to vent a little, e confesso que ver este tipo de comportamento de risco banalizado me deixa assustada. Mais respeito, mais amor-próprio, mais segurança, mais consciência.
Joana-velha-do-Restelo is out!
Excelente texto! Ainda assim o título do texto é o que me deixa com mais duvidas :). Se estamos em completo acordo com a total ausência de controlo das actividades que estes miúdos e miúdas fazem neste tipo de contexto (excesso de álcool, violência, etc.) também é importante continuar a preservar a liberdade para se ter momentos de loucura (em qualquer idade!). A sexualidade (na perspectiva de cada individuo) não é um tema que se aprenda com facilidade em manuais e acho que todos compreendemos isso. Não se aprende a ter o melhor primeiro beijo de sempre e também não se aprende a ter melhor primeira experiência sexual de sempre. Eventualmente nunca serão as melhores, mas serão sempre as "de sempre". é um processo, por vezes assustador, que cada um deve poder viver, de milhões de formas diferentes, mais escondido, mais exposto, mais sensual, menos sensual, mas louco, menos louco, mas nunca menos livre.
ResponderEliminarO problema existe e é preciso actuar, mas cuidado com a cura... Os miúdos de hoje não são menos inteligentes do que os miúdos que nós fomos (há sempre uma tendência para as gerações mais velhas pensarem o contrário :)), mas vivem eventualmente num mundo de muito maior liberdade! Ambos somos do tempo dos pais proibiram as filhas de irem a festas, de usarem saias curtas, etc., pelo simples e até amoroso (calma! :)) facto de quererem "proteger" as suas crias. Os anos 60 e 70 mostraram já como é que o ser humano lida com a liberdade, quando lhe falta educação.
Eu acho que o Froid tinha uma ponta de razão sobre o quão central a sexualidade (e não só o sexo!) é na nossa identidade. É difícil imaginar um mundo com menos hormonas, porque é tendencialmente um mundo de maior controlo e de menos liberdade. Acima de tudo eu acho que é necessário educar o olhar para compreender que um corpo nu pode ser mostrado sem isso significar que está disponível para ser usado. Um corpo nu, de um homem ou de uma mulher, não precisam reservar-se à intimidade se esse homem e essa mulher não o quiserem. Podem estar em filmes, na tv, em fotos, na praia, etc. Podem, mas só estarão em total liberdade se quem os mostra estiver consciente do seu espaço de liberdade e se os e as demais respeitarem esse mesmo espaço. É preciso uma cultura de respeito pela liberdade para que a loucura seja também um direito dos miúdos e dos graúdos! :)
Eu ia comentar mas depois li isto e acho que posso só copiar para aqui: "Acima de tudo eu acho que é necessário educar o olhar para compreender que um corpo nu pode ser mostrado sem isso significar que está disponível para ser usado. Um corpo nu, de um homem ou de uma mulher, não precisam reservar-se à intimidade se esse homem e essa mulher não o quiserem." - é isso mesmo! Mas para isso é preciso que, como um todo, tenhamos consciência de que um corpo nu não é, de facto, necessariamente sinónimo de objecto sexual.
EliminarO ponto onde nós discordamos (e as vezes em que já falamos nisto!) é na influência que as entidades que criam conteúdos (publicitários, media, etc.) têm nisto tudo. Quando o corpo só é usado como ferramenta sexual nestes meios, vemos estas realidades sem noção das consequências. (E convenhamos que nos meios mainstream quando se vê pele é para ser sexualizada).
Se acho bem que os miúdos (e graúdos!) explorem? Claro que sim! Só que explorar com respeito pelo próprio e pelo outro implica que não nos valorizemos exclusivamente pelo nosso poder de atracção sexual, e que não vejamos o outro simplesmente como mais um corpo.
Tu havias de achar piada a este documentário - e aposto que tu e eu veríamos duas realidades bem diferentes :p
É uma realidade assustadora, acho que nem tenho coragem para ver um documentário destes. Um grande texto uma bela mensagem de alerta. No fundo, defendemos tanto a liberdade mas esquecemo-nos que ela acaba quando interferimos na liberdade do outro.
ResponderEliminarBeijinhooo
Eu sou sempre a favor de vermos aquilo que nos possa incomodar - conhecer a realidade só nos enriquece.
EliminarExactamente, é essa a minha questão: o respeito pelo outro e pelo próprio não pode ser posto em causa!
Agora tenho mesmo de ver o documentário :)
ResponderEliminarAcho que nesta, como noutras conversas sobre comportamentos sociais, há que abrir sempre espaço à pluralidade de visões e práticas de vida, mais ou menos conservadoras, desde que todas concordem com os Direitos Humanos. O corpo é um dos, se não O principal factor no comportamento sexual do ser humano, e penso que nisso todos podemos concordar. Por razões naturais, não o podemos negar e essa razão levará sempre a que determinado conteúdo possa ser lido com uma conotação sexual (há gostos para tudo...:)). Se nos anos 50 ou 60 as mulheres lutaram activamente pelo direito ao uso do biquíni (e bem!), hoje entende-se que uma mulher a desfilar em biquíni não é uma acto de liberdade da mulher, mas sim um acto deliberado dos produtores e das produtoras em objectificá-la e ao seu corpo. Será sempre? Fará sentido retirar dos conteúdos o tal excesso de pele que, aos olhos da maioria, desperta um interesse sexual? Sinceramente não sei como se resolve o problema sem ser através da educação e da cultura (mais debate, mais qualidade e menos pimba ao sábado e domingo à tarde já ajudavam!). Temo sempre qualquer tentativa, por mais bem intencionada que seja (senão vejamos a questão dos pais e das saias das meninas), em procurar um consenso sobre o que pode e não pode ser mostrado, o que é passível ou não de ter um carácter sexual, etc. Há uma linha muito ténue entre a defesa do homem e da mulher e a escrita de um manual de costumes do século XXI.
Mas são posts e conversas como esta que ajudam a mudar este mesmo contexto, por isso continua e vestir o casaco (ou saia curta) de velha do Restelo, montada num belo salto alto, ou numa bela sapatilha, com ou sem biquíni por baixo!
Ahah tens! Acho que vais achar interessante.
EliminarClaro que sim: cada pessoa define os seus comportamentos de acordo com as suas opiniões e não seria lógico assumir que todos nos regemos pelos mesmos valores - nem isso seria um mundo onde eu queria viver!
Sem extremismos - acabei de adicionar um EDIT lá em cima por isso mesmo - há que haver espaço para tudo. Não defendo que se torne o sexo um tabu, de todo! Isso só iria tornar-nos mais obtusos e com uma relação ainda menos saudável com ele. Apenas defendo que se deve mostrar mais do que isso - muito mais! - mas "em simultâneo". Para que nos valorizemos como um todo, como pessoa, e não como objecto sexual.
Afinal estávamos em acordo desde o inicio da conversa :D
EliminarOra. Pronto. Dias e dias para chegarmos à mesma conclusão ahah :p
EliminarNão conhecia! Nem nunca passei por este documentário na Netflix :o
ResponderEliminarAcho que me vou aventurar e arranjar coragem para ver e depois volto aqui para reler o teu texto :)
:) o documentário em si não é do outro mundo, mas o seu conteúdo é impressionante (um bocadinho sensacionalista, talvez, but still...) *
EliminarE mesmo em relação à textura, é super interessante ver o que a mesma faz no rosto! Então deita-lhe mesmo a mão ahah
ResponderEliminarOra aqui está um tema que me vai tocando particularmente. Antes de tudo, deixa-me dizer que a construção do texto está perfeita. Gosto quando se fala aberta e diretamente sobre as coisas. Aliás, em relação a estas temáticas, não devem haver rodeios. São realidades que vemos e, para tal, basta sairmos à noite. Concordo que em Portugal não se vê tanto isto. Felizmente. Vê-se, sim, aquele piropo mais rude e aqueles olhos melosos na noite, que parece que "comem" sem tocar.
Não tenho irmãos, mas tenho 3 primos (um primo e duas primas) e pelo-me de medo por elas. Nada tem que ver com sexismo... mas por saber que serão um "alvo" neste género de situações: seja numa viagem de finalistas, numa ida à praia, num passeio no parque ou numa saída à noite... Precisamente pela pressão social e entre pares de que um Homem tem de ser viril e tem de "engatar".
Aqui entra a minha entra a minha visão em relação ao "ser Homem". Sendo-o, não me passa pela cabeça, nunca, seja onde for, tomar atitudes mais vis em relação à Mulher... muito provavelmente pelo respeito que tenho por mim e, consequentemente, em relação aos demais!
No fundo, e para concluir, acho que a sociedade, no geral, tem perdido muitos valores. É uma triste realidade, de facto!
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Obrigada, Miguel! Não sei se se trata de perder valores ou de estes mudarem - afinal de contas, todas as gerações dizem que as mais novas são uma desgraça lol mas se o são, a culpa é de quem os educa - ou seja, "nós". É preciso guiar e ensinar as pessoas a valorizar mais do que uma faceta só. E talvez estejamos num mundo tão centrado em si mesmo que nem isso vemos à nossa frente...
EliminarÉ uma realidade absolutamente horrenda que eu, felizmente, não conheço, o que me leva a ter a mesma ideia que tu - em Portugal esse tipo de cultura não é válido -. Penso que a maior parte dessas pessoas, que vivem nesse mundo priorizam as ligações físicas e desconhecem qualquer tipo de conexão afetiva ou psicológica e, por isso, não as valorizam, o que acaba por levar a essa busca desesperada por contacto físico e ao abuso e desrespeito.
ResponderEliminarhttps://opequenogirassol.blogspot.com/
Talvez seja isso mesmo. O tipo de relações que têm não lhes permite valorizar o outro como pessoa e vêem apenas o lado físico? Não sei. É possível!
EliminarJoana, esta coisa de aprovar comentários no tlm às vezes leva-me a fazer merda, do género eliminar em vez de publicar. Foi o que aconteceu no teu comentário ao meu último post. Sorry 😐. Que o vestido é lindo, é. 😉
ResponderEliminarAhah sem stress Marta <3
EliminarInfelizmente o corpo da mulher é comercializado nestas publicidades, acho muito triste.
ResponderEliminarJá agora nomeei-te para uma Tag no meu blog. Beijinhos!!
O da mulher e o do homem, neste caso! É mal geral. Temos que ir mudando a nossa mentalidade aos poucos.
EliminarTal e quaaaal :D Também sou muito fã de cozinhas e vê-las funcionais é sinónimo de parar lá o tempo todo :D
ResponderEliminarPodias fazer um post sobre ela :o talvez te déssemos uma ou outra ideia :P
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Penso que nunca dei de caras com este documentário coração, mas deixaste-me tão curiosa.. Para ser sincera, acho que vou ver antes de vir opinar porque esta questão perturba-me imenso.
ResponderEliminarTHE PINK ELEPHANT SHOE
Sim - como documentário não é uma obra prima, mas vale a pena ver!
EliminarHello :) Gostei do texto e penso que é importante que mais gente leia isto. Faz todo o sentido o que tu dizes e de facto, analisando bem, sim... Todos já fizemos algo por pressão social.
ResponderEliminarBeijinho*
Obrigada, Ana! O importante é colocarmos a mão na consciência e percebermos o que é que realmente queremos e o que fazemos "porque é assim que toda a gente faz". Isso é tão tóxico!
EliminarSem dúvida alguma, querida Joana :D
ResponderEliminarOhn, obrigado!!!
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