Disclaimer: dado o conteúdo do post, a linguagem não será a mais "cuidada". Fico honestamente fula com estes assuntos.
Em Agosto foram aprovadas alterações legislativas que trouxeram o que nos últimos dias se tem por aí chamado "a criminalização do piropo". Dado ter lido nos últimos dias tanta coisa, tão confusa, e tanta alarvidade sobre isto, e dada a "comentar a actualidade" como sou, achei por bem vir apresentar os meus bitaites. Ora: Se acho bem as alterações à lei? SIM, um gigante SIM. Se acho que ela vai ser aplicada? Nem por isso. (Pois, tenho assim tanta fé no nosso sistema judicial.) Mas faltas de fé e aplicabilidade à parte, este é o enunciado que tem causado tanta discussão:
Portanto. Se alguém não concordar que o direito a não ser importunado/ofendido/whatever deve ser defendido, que me explique porquê, eu agradeço. Aviso desde já que estará a ir contra um dos direitos mais básicos protegidos pela Constituição: o direito da personalidade, que abarca tudo o que nos permite viver com paz e segurança. Assim, todos temos direito à nossa paz e à nossa segurança - acho que até aí todos concordamos.
Posto isto: não vou comentar a lei em si. Vou comentar o que tenho lido nas opiniões acerca dela. Felizmente, vejo muita gente a defendê-la e a perceber a sua necessidade. Mas o que me assusta é ver muita, mas muita gente, a dizer as seguintes pérolas:
Por onde começar? Não sei. Só sei que este tipo de comentários prova quão burros, quão estúpidos conseguimos ser. E não vou dizer que são os homens que são estúpidos - não, porque já li por aí muita coisa desta escrita por mulheres. O assédio sexual é das coisas que mais me dá a volta ao estômago, seja quem for a vítima e o agressor. E a defesa de uma forma de assédio só revela o quão tacanhos podemos ser como sociedade.
Nós sabemos o que é sentir que não devemos andar na rua sozinhas à noite. Nós sabemos o que é ter medo de passar por um grupo de homens que claramente, e ser qualquer pudor, nos olham de cima a baixo e não se coíbem de tecer comentários ao nosso corpo e ao que gostariam de fazer com ele, mesmo que estejamos tapadas da cabeça aos pés e que ninguém lhes tenha pedido opinião nenhuma. Nós sabemos o que é querer vestir uma roupa mais reveladora e ter medo de atrair atenções - e intenções - indesejadas.
Não me digam que é um elogio. Uma frase que inclua c*na, f*dia-te, comia-te, lambia-te, cima, baixo, cu, mamas, NÃO É um elogio, é uma objectificação. É reduzir um ser humano a uma boneca insuflável. Não vamos desatar a prender toda a gente que olhar ou que disser que outra pessoa é bonita ou que tentar meter conversa numa saída à noite. Mas importa criar a noção de que o respeito deve ser mantido. Importa ensinar as nossas crianças que NÃO é correcto nem aceitável comentar a viva voz o corpo de outra pessoa e o seu potencial sexual. NÃO é correcto sexualizar o corpo de uma criança que teve a sorte ou o azar de ter um corpo que cresceu mais depressa do que a mente. NÃO é aceitável ensinar as nossas meninas que não podem andar sozinhas, nem andar de mini-saia nem com decotes, nem responder quando se sentirem ofendidas.
Sei o que é sentir este incómodo. Sei o que é andar na rua com 14 ou 15 anos e ter medo. Sei o que é ter 24 anos e ter medo. E acreditem, eu até me mantenho bastante discreta no que toca a "provocações" (até me custa dizer isto, como se o que eu visto ou a forma como me comporto fosse desculpa para alguém se sentir provocado) - e para dizer a verdade, nunca tive sequer um corpo por aí além que fosse irresistível ao olhar. Simplesmente ser menina/mulher é suficiente. E sei que esta história é a de muitas, vi-as a acontecer à minha frente. Miúdas de 13 e 14 anos que, por terem as mamas grandes, eram olhadas pelos velhotes como se de um pedaço de carne se tratassem, com direito a "convites". Bandos de meninas que eram assediadas por rapazes e por homens com comentários perfeitamente obscenos. Mulheres adultas que não podem passar por um grupo de homens sem serem comidas com os olhos (e trabalhando eu no sector da Construção Civil, podem adivinhar que destas histórias conheço muitas, até na pele). E podia também virar a história ao contrário, porque o assédio aos homens também existe. No entanto, e sabendo que há excepções, sabemos que fisicamente a mulher é mais fraca e também muito mais abusada nestas questões. Embora consigamos manter a calma e responder à altura, não devíamos sequer ter que ser sujeitas a isto sem qualquer tipo de protecção - por isso, sim, esta lei é útil. Se toda a gente tivesse educação e respeito pelo próximo, nem seria necessária. Mas infelizmente vivemos numa sociedade que se gaba de ser justa, mas que tem o machismo entranhado até à mais profunda fibra.
Podia discorrer muito mais por aqui sobre este assunto...mas confesso que tenho medo de vos assustar com o tamanho do post. (Provavelmente já o fiz, obrigada se chegaram até aqui!).
Deixo-vos alguns links de leituras recentes que me parece que dizem bem melhor tudo o que poderia dizer daqui em diante:
UMAR - um texto verdadeiramente esclarecedor da realidade de muitas nós.
Por Falar Noutra Coisa - porque com uma pitada de humor diz-se muito, e não é preciso ser mulher para entender.
Quadripolaridades - eu própria também já pensei de maneira diferente, e importa crescer. E espreitem também este, com alguns apontamentos muito pertinentes e certeiros.
Vinil e Purpurina - mais uns choques de realidade, e a prova de que ainda vivemos num país muito burrinho... e a propósito, no blog da Capazes, uma bela análise de como aprendemos a criar anti-corpos a isto que a longo prazo distorcem a nossa noção de respeito.
CRIME DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL
""Quem importunar outra pessoa, praticando perante ela atos de carácter exibicionista, formulando propostas de teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal." Esta é a nova redação do artigo 170.º do Código Penal.
No artigo 171.º (Abuso sexual de crianças) agrava-se a moldura penal para a importunação sexual quando cometida sobre menor de 14 anos, passando o máximo da pena a três anos e sendo a tentativa punível."
Portanto. Se alguém não concordar que o direito a não ser importunado/ofendido/whatever deve ser defendido, que me explique porquê, eu agradeço. Aviso desde já que estará a ir contra um dos direitos mais básicos protegidos pela Constituição: o direito da personalidade, que abarca tudo o que nos permite viver com paz e segurança. Assim, todos temos direito à nossa paz e à nossa segurança - acho que até aí todos concordamos.
Posto isto: não vou comentar a lei em si. Vou comentar o que tenho lido nas opiniões acerca dela. Felizmente, vejo muita gente a defendê-la e a perceber a sua necessidade. Mas o que me assusta é ver muita, mas muita gente, a dizer as seguintes pérolas:
"É um exagero! Que florzinhas de estufa, defendam-se!"
"Não sei do que se queixam, deviam era agradecer os elogios!"
"Estão a acabar com a liberdade de expressão!"
"Tanta coisa mais séria para tratar e lembraram-se disto!"
E uma pérola chocante, lida numa resposta a uma rapariga que contou que aos 15 anos tinha medo de ir para a escola porque todos os dias ouvia piropos foleiros pelo caminho:
"Já deixavas de ser convencida porque com essa cara não era para ti de certeza!"
Por onde começar? Não sei. Só sei que este tipo de comentários prova quão burros, quão estúpidos conseguimos ser. E não vou dizer que são os homens que são estúpidos - não, porque já li por aí muita coisa desta escrita por mulheres. O assédio sexual é das coisas que mais me dá a volta ao estômago, seja quem for a vítima e o agressor. E a defesa de uma forma de assédio só revela o quão tacanhos podemos ser como sociedade.
Nós sabemos o que é sentir que não devemos andar na rua sozinhas à noite. Nós sabemos o que é ter medo de passar por um grupo de homens que claramente, e ser qualquer pudor, nos olham de cima a baixo e não se coíbem de tecer comentários ao nosso corpo e ao que gostariam de fazer com ele, mesmo que estejamos tapadas da cabeça aos pés e que ninguém lhes tenha pedido opinião nenhuma. Nós sabemos o que é querer vestir uma roupa mais reveladora e ter medo de atrair atenções - e intenções - indesejadas.
Não me digam que é um elogio. Uma frase que inclua c*na, f*dia-te, comia-te, lambia-te, cima, baixo, cu, mamas, NÃO É um elogio, é uma objectificação. É reduzir um ser humano a uma boneca insuflável. Não vamos desatar a prender toda a gente que olhar ou que disser que outra pessoa é bonita ou que tentar meter conversa numa saída à noite. Mas importa criar a noção de que o respeito deve ser mantido. Importa ensinar as nossas crianças que NÃO é correcto nem aceitável comentar a viva voz o corpo de outra pessoa e o seu potencial sexual. NÃO é correcto sexualizar o corpo de uma criança que teve a sorte ou o azar de ter um corpo que cresceu mais depressa do que a mente. NÃO é aceitável ensinar as nossas meninas que não podem andar sozinhas, nem andar de mini-saia nem com decotes, nem responder quando se sentirem ofendidas.
Sei o que é sentir este incómodo. Sei o que é andar na rua com 14 ou 15 anos e ter medo. Sei o que é ter 24 anos e ter medo. E acreditem, eu até me mantenho bastante discreta no que toca a "provocações" (até me custa dizer isto, como se o que eu visto ou a forma como me comporto fosse desculpa para alguém se sentir provocado) - e para dizer a verdade, nunca tive sequer um corpo por aí além que fosse irresistível ao olhar. Simplesmente ser menina/mulher é suficiente. E sei que esta história é a de muitas, vi-as a acontecer à minha frente. Miúdas de 13 e 14 anos que, por terem as mamas grandes, eram olhadas pelos velhotes como se de um pedaço de carne se tratassem, com direito a "convites". Bandos de meninas que eram assediadas por rapazes e por homens com comentários perfeitamente obscenos. Mulheres adultas que não podem passar por um grupo de homens sem serem comidas com os olhos (e trabalhando eu no sector da Construção Civil, podem adivinhar que destas histórias conheço muitas, até na pele). E podia também virar a história ao contrário, porque o assédio aos homens também existe. No entanto, e sabendo que há excepções, sabemos que fisicamente a mulher é mais fraca e também muito mais abusada nestas questões. Embora consigamos manter a calma e responder à altura, não devíamos sequer ter que ser sujeitas a isto sem qualquer tipo de protecção - por isso, sim, esta lei é útil. Se toda a gente tivesse educação e respeito pelo próximo, nem seria necessária. Mas infelizmente vivemos numa sociedade que se gaba de ser justa, mas que tem o machismo entranhado até à mais profunda fibra.
Podia discorrer muito mais por aqui sobre este assunto...mas confesso que tenho medo de vos assustar com o tamanho do post. (Provavelmente já o fiz, obrigada se chegaram até aqui!).
Deixo-vos alguns links de leituras recentes que me parece que dizem bem melhor tudo o que poderia dizer daqui em diante:
UMAR - um texto verdadeiramente esclarecedor da realidade de muitas nós.
Por Falar Noutra Coisa - porque com uma pitada de humor diz-se muito, e não é preciso ser mulher para entender.
Quadripolaridades - eu própria também já pensei de maneira diferente, e importa crescer. E espreitem também este, com alguns apontamentos muito pertinentes e certeiros.
Vinil e Purpurina - mais uns choques de realidade, e a prova de que ainda vivemos num país muito burrinho... e a propósito, no blog da Capazes, uma bela análise de como aprendemos a criar anti-corpos a isto que a longo prazo distorcem a nossa noção de respeito.
Por hoje fico-me por aqui. Boa noite, de cabeça bem erguida!
Concordo com tudo, no entanto julgo que há uma coisa mais importante que criminalizar estes actos. É preciso educar. A educação é a base de tudo e o sistema judicial, mesmo que quisesse, não conseguia dar conta de todos os casos de "importunação sexual". O que me aborrece é que se opta sempre por criminalizar e não por investir num sistema de ensino que seja de tal forma bom, que dele não resulte nenhum(a) atrasado(a) mental. Não seria um milagre, mas certamente teria um efeito mais positivo que a mera criminalização. Educar, ensinar valores de cidadania, de vida em sociedade. Discutir esse tipo de coisas, reflectir em aula, em grupo. Não há momentos para isso e deviam existir (na minha opinião). O ideal, a meu ver, era que não tivesse de chegar à criminalização, que não tivesse de chegar a acontecer.
ResponderEliminarConcordo a 100% contigo, Ana! Daí ter referido a questão de ser necessário ensinar respeito às gerações vindouras. No entanto, "burro velho não aprende línguas", por isso acabo por achar positiva esta mudança. Triste, por ser necessária, mas positiva. Infelizmente há ideias demasiado "fortes" que têm de ser combatidas de forma mais forte do que seria desejável, numa sociedade verdadeiramente educada e com respeito não haveria necessidade disto...
EliminarTambém não sei se a lei vai ter muito efeito mas... tenho alguma esperança. O dia que alguém pagar uma valente multa por um "Olá Borracho, queres por cima ou por baixo?" muitos machos galanteadores são capazes de pensar duas vezes antes de voltar a dirigir as suas poesias às senhoras.
ResponderEliminarHope so! Sem essa poesia de andaime passamos nós muito bem! O problema está em fazer prova disto - vai ser uma dor de cabeça até isto finalmente fazer algum efeito...
EliminarFiquei tão feliz quando esta lei finalmente saiu. Desde sempre desprezei o piropo. Faz-me sentir objectificada, ansiosa, menosprezada, invalidada. Já discuti este assunto imensas vezes com imensas pessoas. Muitos não compreendem que o piropo é assédio sexual. O não poder andar na rua sem levar uma boquinha dessas consegue estragar o dia de uma mulher (e de um homem, claro). Pode deixá-la em estado de alerta durante muito tempo e até deixar sequelas. Quem não compreende esse tipo de insulto não sabe o que é sofrer dele. E depois há os que dizem "não sabes aceitar um elogio". Um elogio? Um elogio é dizerem-me "estás bonita" e não "comia-te toda". Espero que Portugal abra os olhos, é um assunto realmente sério.
ResponderEliminarhttp://venus-fleurs.blogspot.pt/
Precisamente, Marisa. A nossa liberdade não pode ser posta em causa a conta de meia dúzia de iluminados que acham que objectificação é sedução. Infelizmente, vejo por aí muitas mulheres a dizer exactamente o que escreveste, e fico com medo do tipo de respeito e de educação que está a ser passada por essa gente às novas gerações...
Eliminaruma vez mais: falou e disse!!
ResponderEliminar;) há que bater o pé!
EliminarMuito obrigado querida! Lá isso é verdade mas, como se diz por aí: "falem bem ou falem mal, o importante é que falem :D
ResponderEliminarConcordo plenamente com o que disseste e fico feliz por ter sido posta em vigor uma nova lei. Acho de muito mau tom os piropos e todas as supostas "piadolas" de engate. A educação parte de casa... Pena que muito pouca gente se aperceba disso.
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Obrigada! ♥
ResponderEliminarLi tudo e não podia concordar mais contigo!
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